Postado por: Edison Fernandes Seção: ICMS, Tributação – 27/08/2013 às 09h48
O último restaurante que meu pai teve foi o de que eu mais gostei. Era uma casa com um quintal espaçoso no fundo, onde havia uma jabuticabeira e um espaço para o trio de forró tocar nos fins de semana e animar os fregueses (poderia até mesmo dizer clientes). O nome do restaurante é Quintal Brasil – ele ainda existe, embora com outro dono – por razões óbvias: primeiro, pelo espaço ao fundo e, segundo, pela jabuticabeira, uma árvore de origem brasileira.
Dada a sua origem, jabuticaba é um termo corriqueiro quando se faz referência a alguma coisa que é típica e exclusivamente brasileira. E foi assim, como “jabuticaba do combustível”, que a presidente da TAM, Cláudia Sender, denominou o ICMS sobre o querosene de aviação, em matéria do Valor Econômico, na edição de 21 de agosto, assinada por Daniel Rittner e André Borges, porque “gera uma precificação diferente, dependendo de onde abastecemos [as aeronaves]”, situação tipicamente brasileira.
Ouso escrever para discordar da senhora Sender: a jabuticaba tributária não se limita ao ICMS sobre o querosene de avião, mas abrange todo o sistema tributário nacional, especialmente, mas não exclusivamente, os tributos incidentes sobre o consumo.
Para começar pelo imposto citado, o ICMS pode variar em razão da origem, caso seja beneficiado por leis estaduais de atração de empresas, e também do destino, se a operação for interna, interestadual para o Norte, Nordeste, Centro-Oeste ou Espírito Santo ou interestadual para o Sul e Sudeste, exceto Espírito Santo. O ICMS também pode variar se houver ou não previsão do regime de substituição tributária e, nessa circunstância, se os Estados de origem e destino da mercadoria celebraram acordo (protocolo) sobre o assunto. O elemento de distinção mais recente refere-se ao conteúdo de importação: o ICMS é alterado se a mercadoria é totalmente importada, parcialmente importada ou produzida sem qualquer componente importado.
Considerando que o ICMS impacta diretamente o preço de venda da mercadoria, qualquer desses ajustes implicará uma precificação distinta e específica.
O mesmo ocorre na incidência da contribuição para o PIS e a Cofins (tributos federais sobre as vendas). Hoje, é difícil dizer qual a regra geral, haja vista tanta exceção e tanto caso particular previstos em lei. Existem situações em que essas contribuições incidem de maneira específica por classificação fiscal na Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM), ou seja, dependendo do RG do produto – isso mesmo: a incidência tributária chega a ser singular por produto.
Esse quadro gera até certo constrangimento aos profissionais brasileiros, que devem explicar o sistema de tributação para os chefes estrangeiros ou para os consultores de sistemas integrados de gestão empresarial (em inglês, Enterprise Resourse Planning – ERP), no trabalho de configurar os sistemas fiscais e de emissão de notas fiscais.
Muitas vezes, os executivos estrangeiros pensam que esses profissionais brasileiros os estão enganando, dada a complexidade da explicação. Ao final, não é raro que a decisão seja suportada em argumento de legalidade (“faça assim porque a lei manda”) ou em dogma de fé.
Como as mulheres estão em alta tanto no mundo corporativo quanto em postos do governo, resta a esperança de que a mandachuva da TAM seja ouvida pelas autoridades tributárias.
© 2000 – 2013. Todos os direitos reservados ao Valor Econômico S.A. . Verifique nossos Termos de Uso em http://www.valor.com.br/termos-de-uso. Este material não pode ser publicado, reescrito, redistribuído ou transmitido por broadcast sem autorização do Valor Econômico.