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Por: Valor – Blog/coluna Fio da Meada em 30/01/2024.
Erros de projeto e desatualizações são usuais e merecerão, ao seu tempo e modo, os devidos reparos.
Com a vigência da Emenda Constitucional nº 132, de 2023, inicia-se nova fase para a estruturação e implementação da reforma sobre a tributação do consumo.
O ano de 2024 e, possivelmente, o de 2025 serão dedicados a um intenso trabalho de confecção das leis complementares citadas 73 vezes no texto aprovado. Todas as matérias delegadas à lei complementar deverão ser tratadas, estima-se, em ao menos 3 leis complementares, sendo uma delas inteiramente dedicada à instituição do IBS e da CBS, outra destinada a instituir e regular o Comitê Gestor e a terceira definindo as regras do Imposto Seletivo. O processo administrativo fiscal deve ser incluído em alguma delas.
As iniciativas para a confecção dos anteprojetos de lei já foram deflagradas. Por parte do Poder Executivo, o Secretário Extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda editou o Ato Portaria nº 104, de 23 de janeiro de 2024, criando Grupos Técnicos (GTs) no âmbito do Programa de Assessoramento Técnico à Implementação da Reforma da Tributação sobre o Consumo (PAT-RTC). De outro lado, a Frente Parlamentar do Empreendedorismo anuncia a criação de uma comissão com o setor produtivo para construir as suas sugestões. A advocacia, por várias de suas entidades, também se movimenta para contribuir. Outras iniciativas acadêmicas ganham igual força.
Ao fim, todas as inciativas são válidas e tendem a compor valiosa massa crítica para ajudar no debate, estruturação e aprovação do melhor texto possível.
Há muita apreensão da sociedade em relação aos efeitos concretos que os novos tributos provocarão na economia, nos diversos ramos de negócio, nos hábitos de consumo, na redistribuição de riqueza, no desenvolvimento regional e, sobretudo e como consequência de tudo isso, na redução da pobreza e da desigualdade social.
Não há dúvidas de que uma alteração desta magnitude, por mais cuidado e debate que se possa imprimir, trará alguns problemas. Muitos deles já apontados por alguns e outros ainda não percebidos por ninguém, mas que se revelarão no decorrer do processo de implementação.
O fato é que este cenário é absolutamente normal e a correção de rumos será sempre possível e inevitável. Ninguém constrói uma casa ou edita uma lei já pensando em reformá-la, mas sabemos que uma casa, assim como uma lei, descortina imperfeições e sofrem desgaste com tempo, deixando de atender as necessidades do seu criador.
Erros de projeto e desatualizações são usuais e merecerão, ao seu tempo e modo, os devidos reparos. Observe-se que a Constituição Federal de 1988 já foi emendada mais de 130 vezes. E ainda será outras tantas. A Emenda Constitucional nº 132 não é perfeita ou imune a erros.
E mesmo que beirasse a perfeição – o que está longe da realidade -, a norma sempre sofre um natural envelhecimento, distanciando-se gradativamente da sua finalidade inicial à luz de uma sociedade que se transforma cada vez mais rapidamente.
O essencial, a meu ver, é que os novos institutos tenham vindo para ficar. Refiro-me ao conceito de destino, cálculo por fora (tributos não mais incidirão sobre outros tributos), incidência ampla sobre todas as atividades econômicas, ressignificação da não-cumulatividade, desidratação da guerra fiscal, redução substancial do número de alíquotas, simplificação das obrigações acessórias e uma redução das exceções e privilégios.
Mesmo os conceitos acima que ainda carregam contaminações políticas serão testados e poderão ser ajustados com o tempo, chegando-se ao dia em que não serão os bens, os direitos ou os serviços que figurarão no alvo da tributação, mas efetivamente as pessoas que os consumirem.
Devemos, afinal de contas, convergir com a ideia de que os mais pobres e os mais ricos têm o direito de consumir as mesmas coisas. A atual e equivocada ideia de oneração ou desoneração tributária de bens, direitos e serviços não atinge propriamente o seu alvo social, mas a todos indiscriminadamente.
É provável que nunca alcancemos a perfeição em nada do que fizermos. Mas o esforço para alcançá-la nos permite obter resultados sempre melhores.
Sessão solene do Congresso para promulgar a reforma tributária — Foto: Zeca Ribeiro/Câmara dos Deputados Fonte: Agência Câmara de Notícias.