Após mudanças regulatórias, investidores e originadores têm buscado alternativas, o que deve acelerar o crescimento do mercado de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios.
Nos últimos meses, uma série de mudanças regulatórias movimentaram o mercado de capitais, visando reformar a estrutura tributária e o ambiente regulatório de alguns produtos financeiros. Essas mudanças impactaram diretamente produtos que ofereciam vantagens tributárias, como fundos exclusivos, certificados de recebíveis imobiliários (CRI) e do agronegócio (CRA), os quais passaram por ajustes significativos em suas normas. Entretanto, diante dessa reconfiguração, investidores e originadores têm buscado alternativas, o que deve acelerar o crescimento do mercado de Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC), que já vinha em franca ascensão.
O mercado de crédito estruturado demonstrou uma evolução notável nos últimos anos, e os FIDC são um bom exemplo dessa tendência. De acordo com dados da Anbima, de dezembro de 2013 a dezembro de 2023, o mercado de FIDC registrou uma taxa média anual de crescimento de 11%, alcançando um patrimônio líquido (PL) de R$ 442 bilhões ao final de 2023. Esse crescimento, que ganhou impulso principalmente a partir de 2019, foi brevemente interrompido no início da pandemia, mas retomou seu ritmo acelerado a partir de 2021.
Um olhar comparativo entre o mercado de FIDC e a indústria de fundos de investimento como um todo revela uma expansão impressionante. Enquanto o patrimônio líquido consolidado da indústria de fundos cresceu 1,6 vez ao longo da última década, o do mercado de FIDC multiplicou-se por 2,7 vezes no mesmo período.
Com as mudanças regulatórias recentes, o crescimento do mercado de FIDC pode se acelerar ainda mais nos próximos anos, pelas razões que explicamos melhor a seguir.
Tributação de fundos exclusivos
A implementação de “come-cotas” para fundos exclusivos de condomínio fechado, estabelecida pela Lei 14.754/23, tem gerado uma crescente procura por produtos que possam ser mais eficientes tributariamente, como os FIDC. A perspectiva de adiar o pagamento de impostos até a amortização e resgate torna-os mais atrativos, trazendo – mantendo-se tudo o mais constante – resultados superiores pós-impostos, se comparados com fundos sujeitos ao come-cotas, que são tributados semestralmente.
Para manter uma tributação diferenciada, vários fundos exclusivos fechados que investem em cotas de FIDC que eram originalmente Fundos de Investimento em Cotas de Fundos de Investimento Multimercado (FIC FIM) têm sido transformados em FIDC de Cotas (os FIC FIDC), o que foi facilitado pela Resolução 175 da CVM.
Em vigor desde outubro de 2023, a nova norma modernizou o marco regulatório de fundos e flexibilizou as exigências para os FIDC de Cotas. Anteriormente, a Resolução CVM 356 era bastante restritiva quanto à composição da carteira de ativos dos FIDC de Cotas, exigindo uma alocação mínima de 95% do patrimônio líquido em cotas de FIDC. A Resolução 175 tornou a gestão de caixa desse produto mais viável, ao reduzir essa alocação mínima para 67%, o que proporcionou uma maior flexibilidade na gestão dos aportes, amortizações e resgates desses fundos.
Como os FIDC de Cotas podem evitar o come-cotas, sua utilização pode tornar a alocação em FIDC ainda mais vantajosa em comparação com outras aplicações, aumentando os recursos disponíveis para investimentos nesse produto.
Restrições à oferta de CRI e CRA
A resolução 5.118/24 do CMN impôs restrições à oferta de CRI e CRA, levando originadores e investidores a buscarem alternativas. Originadores não vinculados aos setores imobiliário ou agropecuário, como instituições financeiras, têm encontrado limitações para a constituição de CRI e CRA, direcionando seus recebíveis para outros veículos de securitização. Além disso, a redução na oferta de CRI e CRA tem favorecido debêntures incentivadas e outras opções que ofereçam rendimentos após impostos mais altos, como é o caso dos FIDC.
Para exemplificar essa migração de demanda, consideremos um cenário hipotético. Anteriormente, digamos que um CRI proporcionasse um rendimento de 10% ao ano, isento de impostos. Diante da escassez de CRI com esse nível de rendimento, um investidor poderia buscar alternativas tributáveis, como os FIDC, que ofereceriam um rendimento de 11,75% ao ano. Mesmo com a tributação, esse retorno se equipara ao que o investidor obteria em um CRI.
Essas novidades regulatórias e a expectativa de queda nas taxas de juros ao longo de 2024 devem beneficiar o mercado de FIDC com uma demanda ainda mais robusta do que a ocorrida em 2023, que bateu o recorde de novos fundos e PL desde a criação desse produto em 2002.
*Pedro Breviglieri é sócio-gerente de estruturação de produtos da Empírica
E-mail: pbreviglieri@empirica.com.br
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