https://valorinveste.globo.com/blogs – 25/10/2022.
Por Mate Pencz – Empreendedor húngaro formado em Economia pela Harvard University, é fundador no Brasil das startups Printi e Loft e do fundo de venture capital Canary
Apesar de “jovens”, as fintechs já vivem uma segunda onda por aqui.
No último mês, duas notícias vindas do universo das fintechs, as startups que desenvolvem produtos financeiros digitais, ganharam a minha atenção.
A primeira foi a divulgação da lista “The Fintech 250”, que elegeu as 250 fintechs mais promissoras do mundo. A seleção, publicada anualmente pela empresa norte-americana de inteligência de mercado CB Insights, trouxe 13 empresas latino-americanas entre os destaques, sendo nove brasileiras.
Após ter seis representantes na edição 2021 da lista, o Brasil ganhou mais três posições na seleção deste ano e confirmou sua liderança entre os países da América Latina. Um avanço considerável em apenas 12 meses.
A segunda notícia foi a divulgação do relatório Transformação Digital na América Latina, publicado pelo fundo de venture capital Atlântico.
Em sua terceira edição, o estudo trouxe, entre outros achados, um recorte sobre as oportunidades à frente, com destaque, claro, para as fintechs.
Tenho um interesse especial por esse mercado e fiquei entusiasmado, embora não surpreso, ao ler nas páginas do relatório que as startups latino-americanas desse setor estão expandindo seu alcance com força total.
Apesar de “jovens”, as fintechs já vivem uma segunda onda por aqui.
A primeira, focada no mercado B2C, foi marcada por uma explosão de neobancos e a inclusão de mais pessoas no sistema bancário.
Somente entre 2012 e 2021, o número de neobancos na América Latina cresceu de seis para 52. E até setembro de 2021, o Nubank, sozinho, havia fornecido o primeiro cartão de crédito ou conta bancária para cerca de cinco milhões de pessoas.
Já a segunda onda, mais recente, foca na inovação B2B e busca atingir os mesmos padrões de disrupção e inclusão conquistados na primeira.
Vale lembrar que dois fatores contribuíram para esse crescimento acelerado do setor: investimento em infraestrutura – é mais fácil criar uma fintech hoje do que há uma década – e a agenda de inovação de Bancos Centrais de diferentes países da Região.
O Banco Central do Brasil, por exemplo, apostou em projetos de Open Banking, Open Finance e em um meio de pagamento instantâneo, o Pix, que é utilizado por mais da metade da população e já é o meio de pagamento digital mais usado no país.
O lançamento do Pix, aliás, foi um dos mais bem sucedidos no mundo. O pagamento instantâneo “Made in Brazil” levou apenas 11 meses para atingir um bilhão de transações por mês, um quarto do tempo que o UPI, meio de pagamento instantâneo da Índia, lançado quatro anos antes, levou para atingir o mesmo número.
O mais interessante nisso tudo? Outras inovações devem surgir da evolução do Pix e do Open Finance. E é aí que as oportunidades – de negócios e de inclusão – se multiplicam.
Vou usar o mercado de crédito como exemplo. Ao reduzir os custos de serviços financeiros, como fez o Pix, e democratizar o acesso a serviços bancários, um dos objetivos do Open Finance, temos um caminho para baratear o custo do crédito.
E não estamos falando apenas de transações de curto prazo, mas também de longo prazo, como é o caso do empréstimo com garantia de imóvel.
No Brasil, hoje, até pela maneira como o mercado de crédito está posicionado, é muito mais fácil encontrar alguém que fez um empréstimo pessoal do que uma pessoa que fez um empréstimo com garantia de imóvel, embora esse último ofereça um crédito maior, juros menores e um parcelamento mais longo.
A título de comparação, o rotativo do cartão de crédito tem uma taxa de juros média de 309,8% ao ano, contra 12% ao ano do home equity. Nesse ponto, as fintechs têm feito um trabalho importantíssimo de educação do mercado e ampliação do acesso a essa modalidade de crédito, e começam a colher os frutos.
A Credihome by Loft, por exemplo, contabilizou um salto de 164,1% no volume de operações de crédito com garantia imobiliária no primeiro semestre deste ano, e a meta é crescer de 200% a 400% nos próximos cinco anos.
Para garantir o cumprimento da meta, uma das apostas da startup é a agilidade na análise e aprovação de contratos. A fintech, que já comprimiu o prazo dessas etapas de três meses para duas semanas, quer reduzi-lo para uma semana a partir de 2023.
Para isso, está investindo em um sistema de automated value model (AVM), que avalia os imóveis dados como garantia remotamente, sem a necessidade de uma visita presencial. O home equity, claro, é apenas um exemplo do potencial desse mercado, das transformações que soluções financeiras mais simples e baratas podem produzir por aqui.
Não à toa, os serviços financeiros seguem sendo a categoria que mais recebe investimento de venture capital na região.
Somente em 2021, foram investidos U$ 6,1 bilhões nesse mercado, quase a metade (42%) de todos os aportes feitos na América Latina no último ano.
Estou ansioso pelas próximas notícias que virão desse universo.
— Foto: Getty Images