https://valor.globo.com/legislacao – 05/01/2022.
Por Edison Fernandes: Professor doutor da FEA-USP, do CEU-IICS Escola de Direito e da FGV Direito SP, titular da Academia Paulista de Letras Jurídicas.
O papel do advogado é muito mais amplo do que a avaliação de risco do processo.
Além das comemorações de Natal, da passagem de ano e, em muitos casos, das férias, o fim de um ano civil e o início do seguinte é também marcado pelas “cartinhas” de circularização da auditoria externa. No trabalho de fechamento das demonstrações contábeis, os advogados são chamados a opinar sobre a probabilidade de risco dos processos judiciais de variada natureza: cível, trabalhista, tributário, ambiental, penal etc.
A avaliação do advogado orienta a discussão sobre a decisão da administração das empresas quanto ao provisionamento ou não de contingências judiciais.
A atuação do advogado, porém, deve ir além da exclusiva avaliação de risco; para tanto, é preciso que ele entenda os efeitos jurídicos de eventual provisionamento.
A provisão para contingência impacta o patrimônio da empresa. Assim, o ponto preliminar reside na definição de patrimônio: complexo de relações jurídicas com valor econômico (artigo 91 do Código Civil). Em outras palavras, o conjunto dos direitos e dos deveres da empresa, representados, normalmente, por “contratos”. O patrimônio da empresa é o resultado da diferença entre os “contratos” (relações jurídicas) que geram valores a receber e os “contratos” (relações jurídicas) que geram valor a pagar.
calculadora; gráfico — Foto: Steve Buissinne/Pixabay.
A relação entre valores a receber e valores pagar é utilizada por diversos “stakeholders” – especialmente sócios e credores –, mas não só. Se essa diferença é positiva, significa que houve lucro, portanto, os sócios podem vir a ser remunerados com dividendos e os trabalhadores, com participação nos lucros (PLR). Esse aumento de patrimônio da empresa assegura sua solvência, pode assegurar sua liquidez e reduz seu nível de endividamento (alavancagem).
Do contrário, a diferença negativa (valores a pagar superiores aos valores a receber), haverá redução do lucro, podendo chegar ao prejuízo, e do patrimônio, o que vem a comprometer os dividendos, o PLR, a solvência, a liquidez e o endividamento.
A provisão para contingências judiciais é o reconhecimento, no patrimônio, de valores a pagar, ainda que condicionados a uma decisão final do Poder Judiciário.
Quando o risco desse pagamento futuro e/ou incerto é avaliado como provável, o respectivo valor é reconhecido como provisão (passivo). Seus efeitos são a redução do lucro passível de distribuição aos sócios e pagamento de PLR, se o caso, e o comprometimento de diversos índices financeiros da empresa, como os mencionados solvência, liquidez e endividamento.
Em conclusão, a avaliação de risco de uma contingência judicial deve ser seguida da avaliação de todos os seus efeitos jurídicos, a fim que haja oportunidade de prevenir impactos prejudiciais aos negócios da empresa.