Por Rafael Sigollo | Valor – 07/11/2014 às 09h13.
SÃO PAULO – Quando ainda era recém-formado na universidade, Jacob Morgan se sentiu extremamente frustrado com o mundo corporativo. “Sempre diziam que eu ia atuar em projetos interessantes e criativos. No fim, passava o dia montando apresentações em powerpoint”, conta. Essas experiências profissionais o deixaram infeliz e desmotivado, mas também o levaram a tomar uma importante decisão. Ele passou a estudar mais profundamente as novas relações e o futuro do trabalho, e abriu sua própria consultoria, a Chess Media Group.
Hoje, aos 31 anos, Morgan também é palestrante e autor de “The Collaborative Organization” e “The Future of Work”. Além disso, administra a FOW Community, uma espécie de rede global, apenas para convidados, que discute as melhores práticas de gestão e a evolução do trabalho colaborativo.
Com a chancela de alguns dos maiores nomes da administração, como os gurus Gary Hamel e Daniel Pink, e de CEOs de multinacionais como SAP, KPMG, Whirlpool e Schneider Electric, Morgam se tornou uma das vozes mais ativas e requisitadas quando o assunto são as mudanças no ambiente dos negócios.
Nesta entrevista exclusiva a Valor Carreira, Jacob Morgan fala sobre mudanças e lista cinco grandes temas, que se conectam entre si: a ascensão da geração milênio – com os nascidos a partir da década de 1980 –, a globalização, a mobilidade, as novas tecnologias e os novos comportamentos no ambiente de trabalho. Confira a seguir os principais trechos:
Valor: Qual é o maior desafio das companhias atualmente?
Jacob Morgan: Para grande parte delas, o maior desafio é conseguir mudar a mentalidade. Existem empresas que fazem as mesmas coisas, da mesma maneira, há décadas. Elas estão presas a métodos, processos e políticas que até podem ter dado certo no passado, mas que já não são mais adequadas. As companhias têm uma enorme dificuldade em entender e acompanhar as mudanças.
Valor: Por que essas empresas resistem tanto às mudanças?
Jacob Morgan: Mudar sempre é difícil. É um movimento que vai contra a natureza não só do ser humano, mas também das organizações. Algumas empresas percebem que estão ficando para trás, mas não sabem o que fazer ou quais providências tomar. Outras acham que estão bem e pretendem continuar fazendo tudo do mesmo jeito. Existem ainda aquelas que se acham grandes e poderosas demais para que algo ruim aconteça com elas. Todas elas correm sério risco de desaparecer, pois companhias saudáveis e bem-sucedidas estão em constante mudança.
Valor: Como os executivos do alto escalão lidam com as mudanças?
Jacob Morgan: Até alguns anos atrás, os executivos poderiam se dar ao luxo de esperar as coisas acontecerem. Tinham tempo para avaliar a movimentação da concorrência e os impactos no mercado. Refletiam a respeito, criavam um plano de ação e, só então, reagiam. Eles precisam entender que isso não é mais possível. A atual velocidade dos negócios os obriga a acompanhar as mudanças mais de perto. Só assim vão conseguir antecipar estratégias e se adaptar mais rapidamente. É fundamental que o líder seja mais aberto, que tente pensar de forma diferente, experimente e arrisque mais.
Valor: Quais os grandes temas da atualidade que os gestores precisam estar atentos?
Jacob Morgan: Posso citar cinco deles, que estão totalmente conectados: a ascensão da geração milênio – com os nascidos a partir da década de 1980 –, a globalização, a mobilidade, as novas tecnologias e os novos comportamentos no ambiente de trabalho. A tecnologia, que é algo tão natural para esses jovens, facilita a globalização e permite mais mobilidade, transformando o ambiente corporativo e tornando-o mais horizontal e menos hierarquizado.
Valor: As relações de trabalho tradicionais se tornaram obsoletas?
Jacob Morgan: Sim. Uma das maiores mudanças nesses últimos anos é o fim da lealdade entre empresa e empregado. Hoje não existe mais estabilidade no trabalho. Você pode ser demitido a qualquer momento, sem nenhuma razão ou explicação. Ao mesmo tempo, os profissionais estão sempre de olho no mercado, em busca de novos desafios e oportunidades para suas carreiras.
Valor: Nesse novo contexto, como é possível ter funcionários engajados?
Jacob Morgan: Mudando o discurso. As empresas não podem mais falar sobre plano de carreira, programas extensos de desenvolvimento e promoções por tempo de casa. O que elas podem oferecer são projetos de curto prazo, desafios contínuos e a oportunidade de atuar de forma colaborativa, inclusive com áreas e equipes diferentes.
Valor: O que mais uma empresa precisa oferecer para ter os melhores talentos?
Jacob Morgan: Depende do setor, da indústria e do tipo de negócio. Também varia internamente, nas diferentes áreas e níveis de uma organização. Desse modo, as empresas vão ter que descobrir isso por elas mesmas. A melhor maneira é prestar atenção no que os funcionários valorizam, o que acham importante e o que os torna mais engajados. Isso não pode ser ignorado.
Valor: Está ficando cada vez mais difícil engajar os colaboradores?
Jacob Morgan: Pelo contrário, nunca foi tão fácil engajar as pessoas. Com as possibilidades e alternativas que temos hoje, as empresas podem fazer muita coisa nesse sentido que não podiam alguns anos atrás. Além da tecnologia, que abre diferentes canais de comunicação e derruba barreiras entre chefes e colaboradores, temos uma grande quantidade de pesquisas e estudos sobre o assunto, além de novas ferramentas, técnicas e métodos. O problema é que algumas empresas não acreditam, não se importam ou não enxergam isso como prioridade. Se não fizerem nada, porém, os melhores não vão querer trabalhar para elas.
Valor: Qual é o papel do líder nesse processo?
Jacob Morgan: Ainda enxergamos no líder aquele sujeito que dá ordens, que nos diz o que fazer e como fazer. O papel do líder, no entanto, é ajudar. Ele deveria ser uma espécie de mentor ou de coach. Ou seja, a pessoa que retira os obstáculos do caminho de seus funcionários para que eles possam trazer os melhores resultados. Esse executivo precisa garantir que todos tenham as condições e os recursos necessários para fazer o que precisam dentro das diretrizes, do direcionamento e da visão da companhia.
Valor: O dinheiro ainda é um grande fator de engajamento no trabalho?
Jacob Morgan: Sem dúvida, e isso é totalmente compreensível. Ninguém quer estar em uma companhia que não paga bem. No entanto, a remuneração precisa estar atrelada a outros fatores para resultar em engajamento, e não funciona isoladamente. Talvez você trabalhe em um determinado lugar apenas porque precisa, porque pessoas dependem de você e do seu salário. Nesse caso, o dinheiro até pode segurá-lo por um tempo na empresa, mas isso não significa que você vai ser um funcionário engajado.
Valor: E o que o colaborador deve fazer em uma situação como essa?
Jacob Morgan: É preciso avaliar se os fatores que o estão deixando desmotivado podem ser modificados ou melhorar com o tempo. É importante também tentar enxergar o valor e o significado daquilo que você está fazendo, e ter uma conversa com o chefe também pode ajudar. Não acho que alguém deva ficar em um trabalho onde se sinta mal e, às vezes, só resta mesmo trocar de emprego. Hoje é fácil aprender sobre qualquer assunto, existem cursos abertos na internet e sempre podemos desenvolver novas habilidades. Assim, a idade também não pode ser usada como desculpa para prendê-lo em algo que não queira fazer.
Valor: Quais as grandes mudanças em relação ao treinamento e desenvolvimento dos funcionários?
Jacob Morgan: O aprendizado não deve vir somente da companhia para os colaboradores. Com a ajuda da tecnologia, os próprios funcionários podem aprender entre si. Atualmente, eles têm condições de trabalhar em projetos, trocar informações e tirar dúvidas uns com os outros mesmo atuando em países diferentes. Se você, no Brasil, precisa aprender algo que é a minha especialidade, posso ajudá-lo em tempo real aqui dos Estados Unidos. Todos devem ser professores e alunos. É preciso desenvolver essa mentalidade, e não apenas ficar esperando que a empresa o coloque em um curso.
Valor: Essa colaboração precisa ser incentivada dentro das companhias?
Jacob Morgan: Sim, inclusive entre funcionários de diferentes áreas, empresas e mercados. As empresas precisam investir em tecnologia e em plataformas de colaboração. Só assim vão manter todos conectados, compartilhando informações e conhecimento. Essa será a base do trabalho no futuro.
Valor: O senhor sente resistência dos executivos mais experientes em relação a suas ideias, uma vez que ainda é bastante jovem?
Jacob Morgan: Pelo contrário. Completei recentemente 31 anos de idade e, como estudo as novas relações corporativas, os conflitos geracionais e o futuro do trabalho, ser jovem é uma vantagem. Presto serviços para multinacionais de diversos países e setores, e elas querem que eu as ajude não apenas com dados, consultoria e estratégias, mas também com o ponto de vista de quem faz parte dessa geração.
Valor: Por que o senhor decidiu seguir por esse caminho?
Jacob Morgan: Basicamente, foi porque tive experiências muito ruins trabalhando para outras pessoas. Após me formar na universidade, passei por algumas empresas em Los Angeles, onde moro. Nos processos seletivos, sempre diziam que eu ia atuar em projetos interessantes e criativos. No fim, passava o dia montando apresentações em powerpoint. Estava muito infeliz e desmotivado, mas a gota d’água foi quando o CEO da companhia me mandou buscar café para ele. Nesse exato momento, decidi que não queria mais aquilo e comecei a trabalhar por conta própria.