https://valor.globo.com/opiniao/coluna – 07/11/2025.
Por Luiz Carlos Dutra (*)
– Foto: Oleg Gamulinnkii/Pixabay
Estamos em 2025, e já é tempo de saber que a credibilidade de uma organização depende muito menos de slogans do que da coerência e consistência entre a forma pela qual é governada, como se comunica, e como atua. Uma crise de governança expõe de forma contundente como a desconexão entre discurso e prática pode corroer a confiança, influenciar decisões-chave e colocar a longevidade da organização em risco, afetando sua reputação e consequente competitividade.
Quando a Governança organizacional desempenha um papel isolado como cumpridora de formalidades de regras e estruturas, compliance e atendimento às metas regulatórias, ela não somente perde a efetividade como também abre espaço para a falta de sintonia entre o que a organização promete e o que efetivamente realiza.
Governança-Pessoas-Reputação: os pilares do valor sustentável
Uma abordagem de Governança Estratégica parte do princípio de que, no centro das estruturas decisórias está o Propósito Organizacional. Essa abordagem muda tudo, e torna-se o fio condutor para a relação intrínseca entre governança (dinâmica endógena) e reputação (impacto exógeno), tendo o capital humano como o meio pelo qual essa (e toda) relação opera.
Ao longo do meu contínuo aprendizado profissional, tenho enfatizado a importância de enxergar a tríade Governança-Pessoas-Reputação como pilares indissociáveis que, juntos, orientam investimentos, parcerias, gestão de risco e, acima de tudo, atuam como motores de resiliência, longevidade e valor sustentável para todos os stakeholders.
Em uma situação de crise, por exemplo, a consistência entre discurso e prática – que é alcançada por essa abordagem integrada – aporta um componente de confiança que facilita a gestão das adversidades.
A conexão entre os três pilares de Governança, Capital Humano e Reputação, contudo, é muitas vezes um dos principais desafios a serem vencidos internamente. O que torna essa simbiose possível é justamente seu alinhamento por meio de valores compartilhados, praticados de forma realmente sólida.
A Governança, nessa abordagem, transcende a formalidade das regras e estruturas; ela está enraizada no propósito da organização e dispõe de instrumentos que buscam assegurar que as decisões em todos os níveis considerem esse propósito como o fiel da balança. A estrutura para isso parte de um conselho eficaz, que combina composição equilibrada do quadro de consultores, avaliação periódica de independência, políticas claras de conflito de interesses e comitês atuantes (risco, auditoria).
O uso de dados transparentes também funciona como um filtro de qualidade para decisões estratégicas e operacionais e, por fim, divulgações consistentes permitem aos stakeholders entender não apenas o que foi decidido, mas porque foi decidido, contribuindo decisivamente para a construção da Reputação.
A Reputação, por sua vez, não é apenas o resultado, mas um ativo que se constrói e se protege ao longo do tempo. Ela nasce da consistência entre o que a organização diz e o que pratica, especialmente na gestão de riscos, na qualidade, transparência dos dados divulgados e na integridade das relações com credores, clientes e comunidade.
Manter o diálogo aberto com os stakeholders, levando informações sobre as estratégias de governança, incluir análises de métricas de desempenho não apenas financeiras, demonstrar o compromisso com padrões éticos e de responsabilidade social, precisam ser parte do dia a dia, e da construção do senso de comunidade. Tentar estabelecer uma comunicação proativa quando uma crise se instaura é um risco muito grande. A confiança é um ativo que se conquista dia após dia.
Já o Capital Humano, maior ativo de qualquer empresa, é composto pela combinação de lideranças e talentos com uma cultura robusta, fundamentada no propósito da organização. Responsável por traduzir planos em resultados sustentáveis, o capital humano não pode ser visto apenas como executor. É aqui que é validada a viabilidade das decisões estratégicas, e é também onde são identificados riscos ainda ocultos e realizados os protocolos de melhoria contínua.
Conectar todos os membros da organização ao propósito único é o caminho para que a prática realmente traduza a estratégia em todos os pontos, evidenciando o benefício da sinergia positiva de Governança com Reputação.
Propósito e Resultado Sustentável: desempenho e resiliência caminhando juntos
A jornada do propósito até o desempenho econômico se dá por três movimentos entrelaçados, que tornam a estratégia não apenas justificável, mas mensurável no dia a dia da organização:
- O Propósito deixa de habitar o papel de conceito abstrato e passa a orientar escolhas: ele vira um critério para avaliar opções estratégicas, investimentos, parcerias, metas operacionais e remuneração. Assim, decisões passam a carregar um norte claro, alinhado ao que a organização pretende ser no longo prazo.
- A Governança assume uma parte central da estratégia. Compliance e gestão de riscos são ativados como condutores dessa jornada, conectando responsabilidades, controles e transparência aos objetivos de valor sustentável. Esse amadurecimento da governança reduz a distância entre o que é prometido e o que é entregue, fortalecendo a confiança de stakeholders internos e externos.
- A matriz de decisão passa a ser orientada para a criação de valor sustentável, equilibrando desempenho imediato e ambição de longo prazo. Esse equilíbrio libera o Capital Reputacional como vantagem competitiva, pois a reputação deixa de ser efeito colateral para tornar-se resultado direto de decisões consistentes e de ações coerentes ao longo do tempo. Quando o Propósito embasa a tomada de decisão, a organização transforma previsibilidade em confiança, e confiança em capacidade de investir e inovar com tranquilidade.
Ao estabelecer práticas de governança estratégica, que atua como filtro de qualidade, transparência, sustentabilidade e integridades, e ao equilibrar as metas imediatas como investimentos orientados ao propósito, utilizando métricas e indicadores que conectam o resultado ao impacto social, ambiental e confiança do ecossistema, o efeito final é uma organização cuja proposta estratégica não fica reduzida a uma promessa, mas se materializa em práticas estáveis que fortalecem a resiliência, reduzem incertezas e criam condições para um crescimento sustentável.
O segredo da longevidade corporativa do século XXI é simples: governar com propósito, agir com transparência e cultivar reputação – dia após dia, decisão após decisão.
(*) Luiz Carlos Dutra é presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfurmaria e Cosméticos (Abihpec), membro Conselho Administração MOTIVA e membro do Conselho Deliberativo da ESPM.






