FIDCs se aproximam de R$ 1 trilhão e serão as novas ‘vedetes’ do mercado, diz presidente da Anfidc
https://valorinveste.globo.com/produtos/fundos/noticia – 10/11/2025.
Por Yasmim Tavares, Valor Investe — Rio
Samuel Garson afirma que os FIDCs deixaram de ser o ‘patinho feio’ e viraram o ‘cisne’ do crédito estruturado e defende o produto como importante canal de desbancarização no país.
Samuel Garson, da Anfidc: ‘Porta para investidor do varejo está se abrindo’ — Foto: Léo Pinheiro/Valor.
Os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDCs) atravessam uma fase de expansão acelerada e consolidação no mercado. Segundo dados da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o patrimônio líquido da indústria já ultrapassa R$ 810 bilhões, e a expectativa é que o volume alcance R$ 1 trilhão em breve. Quem faz essa projeção é Samuel Garson, recém-empossado presidente da Associação Nacional dos Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (Anfidc).
Para ele, a combinação de novas regras da Resolução CVM 175 com a entrada gradual do investidor pessoa física tem potencial para expandir a classe e colocar o FIDC “entre as vedetes do mercado de crédito brasileiro”.
“Hoje os FIDCs estão com cerca de R$ 810 bilhões de patrimônio e a tendência natural é alcançar a casa de R$ 1 trilhão em pouco tempo. O ambiente regulatório amadureceu, há transparência e a porta para o investidor de varejo está se abrindo”, afirma Garson.
Entrada do investidor pessoa física
A principal transformação recente da indústria foi o acesso direto do varejo ao produto. Desde que a Resolução CVM 175 entrou em vigor, em outubro de 2023, pessoas físicas passaram a poder investir em FIDCs.
Com a abertura regulatória já consolidada, Garson acredita que os FIDCs vivem uma nova fase de diversificação, deixando de ser um produto voltado apenas a instituições financeiras e investidores qualificados. “O pequeno investidor começa a participar de uma indústria sólida, com governança robusta e papel social relevante. É um passo importante para democratizar o crédito privado no país”, afirma.
A maior parte do capital vem de investidores institucionais, que compram cotas subordinadas em busca de retornos mais altos. Essas cotas funcionam como uma espécie de amortecedor de risco, uma vez que são as primeiras a absorver eventuais perdas da carteira e, por isso, oferecem remuneração maior.
Com a nova regulamentação, o varejo passou a ter acesso direto às cotas seniores, que têm prioridade no recebimento dos rendimentos e são protegidas pelas subordinadas. Na prática, isso permite que o investidor pessoa física participe do mercado de FIDCs com menor exposição ao risco de crédito, mas ainda com rentabilidade competitiva à de outros produtos tradicionais de renda fixa.
Segundo Garson, a entrada dos pequenos investidores em FIDCs será gradual e educativa, passando inicialmente pelas gestoras e plataformas de distribuição.
“É um processo de aprendizado coletivo. As plataformas já são grandes compradoras de FIDCs e conhecem o produto. Agora, vão ajudar a pulverizar o acesso, oferecendo aos clientes uma opção de crédito com rentabilidade diferenciada e alto nível de segurança”, explica.
No primeiro momento, os FIC-FIDCs, fundos que investem em cotas de FIDCs, podem ser uma porta de entrada mais comum para o investidor final, funcionando como uma espécie de vitrine do setor. “O investidor vai conhecer o produto aos poucos, ver a rentabilidade e a segurança, e, com o tempo, passará a investir direto nos FIDCs de sua preferência”, diz Garson.
Segundo o executivo, o caminho será semelhante ao que ocorreu com outros tipos de fundo de crédito, como os fundos imobiliários, que caíram no gosto do investidor aos poucos e formam atualmente uma base de milhões de cotistas.
Mesmo com essa expansão em curso e a entrada de novos investidores, Garson acredita que o perfil conservador do produto deve permanecer.
“O FIDC não é para aventureiros. Ele exige lastro, estrutura e gestão profissional. A entrada de novos participantes será acompanhada de perto por gestoras e administradoras, que travam operações vistas como fora dos padrões. É por isso que o produto é seguro”, afirma.
Segundo ele, a taxa média de perdas do mercado de FIDCs é pequena, entre 1,5% e 3% ao ano, e abaixo de outras modalidades de crédito privado. “Há um colchão de segurança gigantesco. A combinação de subordinação, seguro e governança faz com que o risco efetivo seja muito bem controlado”, completa.
Colchão de proteção
Um dos elementos garantidores dessa segurança é a presença das cotas subordinadas, que funcionam como uma espécie de amortecedor de perdas para as cotas seniores (as que o investidor pessoa física pode investir).
Garson comenta que, em média, cerca de 33% do capital de um FIDC é composto por cotas subordinadas, que absorvem eventuais inadimplências. Assim, um fundo de R$ 100 milhões teria pouco mais de R$ 30 milhões destinados exclusivamente à cobertura de perdas, o que, segundo ele, garante conforto adicional ao investidor.
“Os FIDCs têm um nível de proteção que nenhum outro produto oferece. Até 30% da inadimplência está coberta pelas subordinadas. Mesmo nos momentos mais críticos, o investidor mantém a rentabilidade contratada e dificilmente vê o valor de face se deteriorar”, ressalta o executivo.
Garson lembra ainda que a maior parte dos FIDCs tem estrutura multicedente e multisacado, o que aumenta a exposição entre diferentes empresas e setores e, assim, reduz o risco de concentração.
“Os regulamentos limitam o percentual de concentração por cliente, o que impede desequilíbrios. Os fundos com essa estrutura têm diversos recebíveis pulverizados. Isso praticamente elimina o risco de uma quebra relevante”, afirma.
De “patinho feio” a “cisne”
O executivo, que também é fundador da Garson Crédito, gestora com três FIDCs sob administração e quase três décadas de atuação no crédito estruturado, diz que o setor passou por uma transformação silenciosa nos últimos anos.
“Durante muito tempo o FIDC foi o patinho feio do mercado. Era uma aplicação pouco conhecida, com estrutura complexa e limitada a investidores institucionais. Hoje, virou o cisne: é o instrumento mais completo e transparente para dar crédito e captar recursos”, diz.
O arcabouço regulatório amadureceu, o número de gestoras especializadas aumentou e o número de fundos só cresce. Ao mesmo tempo, a percepção de risco do produto foi se ajustando à medida que a estrutura dos fundos se mostrou resiliente, mesmo em cenários de estresse do mercado.
“O FIDC é, por natureza, um produto de governança robusta. Há um tripé formado por consultoria de crédito, gestora e administradora, que garante controle em todas as etapas. É uma estrutura complexa, mas justamente por isso muito segura”, explica Garson.
Desbancarização do crédito
Para o novo presidente da Anfidc, o avanço dos FIDCs representa também uma mudança de paradigma no crédito brasileiro, historicamente concentrado nos grandes bancos. “O papel do FIDC é desbancarizar. Ele leva crédito principalmente para pequenas e médias empresas, que são a base da economia brasileira”, argumenta.
Segundo Garson, os FIDCs ocupam um espaço onde o mercado ainda é carente de crédito, funcionando como um elo entre o investidor e empresas que precisam de capital para crescer. “A gente atua atendendo médias e pequenas companhias. O crédito no Brasil ainda é escasso e muito bancarizado, e o papel do FIDC é justamente ser mais uma nova opção de financiamento”, explica.
O executivo ressalta que esse movimento também traz mais transparência e opções ao sistema de crédito, aproximando o gestor do tomador e criando uma relação de parceria.
“O FIDC passa a ser um parceiro do empresário, ajudando a entender sua demanda e oferecer soluções sob medida. É um modelo que diversifica as fontes de crédito e fortalece o setor produtivo do país”, completa Garson.
Papel da Anfidc
À frente da Anfidc pelos próximos três anos, Garson defende a importância de focar em educação financeira, institucionalização do mercado e diálogo com reguladores para que a indústria continue em trajetória de crescimento.
“A Anfidc é hoje a principal representante dos fundos de crédito no Brasil. Temos um diálogo muito aberto com CVM, Banco Central e gestoras. Esse relacionamento é essencial para continuar evoluindo o produto e garantir segurança para o investidor”, diz.
Para Garson, o FIDC é hoje um instrumento indispensável para o mercado nacional de crédito, especialmente em um país com estrutura produtiva composta majoritariamente por pequenas e médias empresas. “É um produto que veio para ficar. Ele desbancariza, dá transparência, leva crédito a quem precisa e oferece segurança a quem investe. Essa é a essência do FIDC”, resume Garson.






