https://valor.globo.com/financas/noticia – 26/08/2024.
Por Victoria Netto, Valor — Rio.
Resoluções 209 e 210, que tratam da portabilidade de investimentos, entrarão em vigor em 2025.
A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) editou nesta segunda-feira as duas normas que regulamentam a portabilidade das aplicações financeiras, previstas na agenda regulatória de 2024 da autarquia: a resolução 210, que estabelece regras e procedimentos, e a 209, que complementa o marco com alterações em normas anteriores.
https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/resolucoes/resol209.html
https://conteudo.cvm.gov.br/legislacao/resolucoes/resol210.html
A regulação final foi bem recebida por advogados, que destacam como positivo o alinhamento entre a proposta da audiência pública aberta pela CVM de outubro a dezembro de 2023 e a incorporação das sugestões feitas.
As regras são aplicáveis a custodiantes, intermediários, depositários centrais, entidades registradoras e administradores de carteiras.
Apelidada de “pix de investimentos”, a portabilidade segue sem custo para o investidor e entra em vigor a partir de 1º de julho de 2025. As resoluções integram a agenda de “Open Capital Markets” e do “Open Finance”, em que o cliente é quem dá autorização para compartilhar seus dados financeiros e assim ter acesso a produtos e custos mais vantajosos.
O presidente da CVM, João Pedro Nascimento, disse que essa é uma forma de empoderar o investidor e ao mesmo tempo modernizar o mercado de capitais. “Temos a expectativa de fomentar um saudável ambiente de competição pela simplificação e desburocratização das regras de transferência de custódia.”
Entre os destaques da norma está a possibilidade de o investidor escolher onde vai solicitar a portabilidade: na origem, no destino ou junto ao depositário central, no caso a bolsa.
Na análise de impacto regulatório, a CVM propunha que o pedido fosse feito no destino, a exemplo do que ocorre em países como Austrália, Estados Unidos e México — e também na portabilidade da previdência aberta. Mas a versão final acatou sugestões da consulta pública e trouxe mais flexibilidade. O texto passou a prever a interface digital para a solicitação de transferência, mas não excluiu o potencial uso de cadastro físico para o investidor que preferir esse caminho.
O sócio do Bocater Advogados, Maurício Jayme e Silva, diz que isso traz mais autonomia e poder de escolha para o investidor. “Muitos investidores que não estão nos grandes centros financeiros preferem fazer a solicitação de transferência de valor mobiliário manualmente e podem continuar fazendo.”
Além disso, as regras preveem que o investidor possa acompanhar o andamento e prazos em tempo real. As normas estipulam o escalonamento do cronograma e a disponibilização de dados sobre a portabilidade à CVM e às entidades autorreguladoras. Estabelecem ainda a classificação de “infração grave” o descumprimento sistemático de prazos.
Jayme e Silva lembra que a antiga norma de custódia estipulava dois dias úteis para a transferência dos investimentos, o que muitas vezes não era factível. Agora, a depender da classe de ativo, a norma estabelece de dois a nove dias úteis.
“Isso respeita a complexidade da transferência de custódia e de todos os demais agentes envolvidos”, diz. Os valores mobiliários, que contam com uma depositária central, têm até dois dias úteis. Derivativos negociados em balcão podem ser transferidos em até cinco dias, enquanto as cotas de fundos de investimento em até nove.
As mudanças incluem a revisão de procedimentos para que a portabilidade seja feita em uma única etapa, e não em três. Outra alteração é a atuação do custodiante ou intermediário de destino como auxiliar do investidor no processo.
A norma traz ainda que depositárias centrais e escrituradores não precisarão armazenar informações históricas sobre preço unitário e de aquisição. Esse dever ficará com o custodiante ou intermediário de origem.
Já as transferências com alteração de titularidade não integrarão a norma, assim como as transferências entre depositários centrais ou entre entidades registradoras.
Na avaliação de Carlos Martins Neto, sócio do Moreira, Menezes, Martins Advogados, as medidas criam um ambiente mais seguro e transparente, com maior competição entre os prestadores de serviço do mercado de capitais e de investimentos. “Quem sai ganhando é o investidor. A regulação veio em ótima hora, principalmente pela questão de que, se há investimento de um mesmo titular em instituições diferentes, não precisa resgatar para reaplicar.”
O diretor de operações de crédito da Efí Bank, Denis Silva, diz ver a portabilidade alinhada à agenda de Open Finance do BC e destaca que vai forçar a padronização e digitalização do mercado. “Ainda tem muita casa que faz ordem por papel ou por e-mail. Há uma limitação tecnológica e agora [a regra] vai ter até 2025 para ser implantada.”
— Foto: Gerd Altmann/Pixabay