https://valor.globo.com/legislacao – 14/08/2020.
Por Gustavo Gomes e Pedro Beretta.
É de extrema importância que as empresas brasileiras analisem de forma detalhada as atualizações trazidas pelo DOJ e pela SEC.
Há mais de 40 anos, o Congresso Americano, de forma pioneira e principalmente com o intuito de ratificar e preservar suas políticas internas de controle, criou e colocou em prática a mais paradigmática lei de “combate a corrupção” já existente.
Chamada de Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), seu objetivo principal é combater pagamentos e subornos à funcionários governamentais, por empresas americanas ou das mais diversificadas nacionalidades – que possuam valores imobiliários ou transacionam em território americano -, evitando, assim, qualquer benefício ilícito em negócios realizados.
É de extrema importância que as empresas brasileiras analisem de forma detalhada as atualizações trazidas pelo DOJ e pela SEC
Sob fiscalização rigorosa do The United States Departament of Justice (DOJ) e da Securities and Exchange Comission (SEC), tais empresas, inclusive brasileiras, estão submetidas às regras e penalizações – administrativa e principalmente criminais – da FCPA.
Foi assim que no ano 2012, pela primeira vez, o DOJ e a SEC publicaram um “Guia Prático da FCPA” denominado “A Resource Guide to the U.S. Foreign Corrupt Practices Act”, a fim de que as empresas pudessem, de forma didática, entender todas as aplicações trazidas pela lei.
Dentre suas principais diretrizes, podemos destacar questões como para quem a lei é submetida; sua aplicação e jurisdição; requisitos de um programa efetivo de compliance; fatores a serem considerados, em uma investigação, pela DOJ e SEC; além, claro, ‘jurisprudências” civis e principalmente criminais de casos envolvendo as normas da FCPA
No mesmo sentido, desde o ano de 2017, é publicado um “Guia de Programas de Compliance”, denominado “Evaluation of Rorporate Compliance Programs”, com o fim de guiar Promotores de Justiça americanos quanto a avaliação da efetivação de programas de compliance das empresas aderentes, quando ocorrido algum fato.
Pois bem, passados quase dez anos da implementação de tais diretrizes, tanto o DOJ como a SEC, viram-se obrigados a endurecer seus “Guias” referentes a FCPA, tanto de compliance (em junho de 2020), quanto de conceitos e explicações (em julho de 2020), com um único propósito: de endurecer as regras de combate a corrupção e de compliance em relação as empresas submetidas a FCPA!
Agora, promotores americanos analisarão ainda mais a necessidade de investigar transações e atos, bem como reforçarão às empresas que a cooperação com as autoridades, com report de atos ilegais e, principalmente, a adequação de um efetivo programa de compliance serão muito bem vistos quando da apuração de responsabilidade perante a Justiça Americana.
De acordo com o próprio DOJ, “não existe um programa de compliance perfeito, mas tais têm a obrigatoriedade de serem bem-planejados, possuírem boa-fé e terem plena funcionalidade prática”.
Nesse sentido destacam-se, dentre outras “novas” medidas, principalmente a necessidade de maior avaliação dos riscos e a realização de due diligencies, não somente no momento da contratação do terceiro, mas em todo o processo negocial.
Isso porque, segundo estudos da Universidade de Stanford, a maioria das condutas ilícitas cometidas em face das normas da FCPA são realizadas por terceiros estranhos à negociação, motivo pelo qual se faz necessária a adoção de políticas rigorosas de due diligences em todo os atos da transação.
Cumpre ressaltar que a FCPA e seus “Guias” foram de importante influência para a criação de normas de combate à lavagem de dinheiro e corrupção no Brasil – máxime se verificarmos a quantidade de empresas brasileiras submetidas as tais regras -, como o Manual Prático de Avaliação de Programa de Integridade da Controladoria Geral da União e Instrução Normativa nº 617, da Comissão de Valores Imobiliários (CVM), que também endurecerão as suas regras no mesmo sentido.
De outra forma não poderia ser! Segundo um artigo publicado pela KPMG, as empresas brasileiras são responsáveis por cerca de 30% dos acordos ou penalidades aplicadas às empresas estrangeiras, pelas normas contidas FCPA. O que demonstra que mesmo que as empresas possuam programas de compliance – mas não como aquele descrito na FCPA – desembolsarão milhões de dólares ao governo americano, por infração às suas regras.
Ou seja, simplesmente “ter” um programa de compliance em nada adianta! Tem este de ser efetivo, monitorado, inclusive perante a terceiros, o que é não costumeiro no Brasil.
Em conclusão, fato é que é de extrema importância que as empresas brasileiras analisem de forma detalhada as atualizações trazidas pelo DOJ e pela SEC, com o consequentemente endurecimento nas suas práticas de combate à corrupção e de programas de compliance, de forma efetiva, nos termos da lei, e com a finalidade de, ao menos, se prevenirem de eventual responsabilidade administrativa e criminal, tanto no Brasil como nos Estados Unidos.
Gustavo Nascimento Gomes e Pedro Beretta são, respectivamente, advogado de Höfling Sociedade de Advogados, pós-graduado em Direito Penal e Processo Penal pela Universidade Presbiteriana Mackenzie; sócio no mesmo escritório, pós-graduado em Direito Penal Econômico e Europeu pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, em Portugal. Possui formação executiva em Mercados Financeiro e de Capitais pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
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